quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Organizações sociais. A máfia organizada na saúde.


Antes da promulgação da constituição de 1988, só tinham acesso gratuito a saúde trabalhadores com registro em carteira ligados ao falecido INAMPS. Quem não era trabalhador formal ou não tinha acesso à carteira assinada, ficava marginalizado, não era atendido ou até mesmo era, mas de forma muito precária. Após a promulgação da CF/88 ficou garantido a todos os cidadãos brasileiros a universalização dos serviços de saúde, através de um regime público e gratuito conhecido como SUS sistema único de saúde, sendo regulamentado pelas leis 8080/90 e 8142/90. Todas essas conquistas, com certeza foram uma luz no fim do túnel para todos os trabalhadores registrados e informais que viviam a mercê do INAMPS, dos planos de saúde privados ou na indigência. Passados mais de 20 anos o SUS é um sistema consolidado, com ampla rede de hospitais espalhados por todo o país, unidades básicas de saúde (famoso postinho), o programa saúde da família, os agentes comunitários de saúde e uma imensa quantidade de remédios distribuídos gratuitamente. Cabe ressaltar que verdadeiros impérios como os ESTADOS UNIDOS não têm o acesso à saúde garantido a todos, e a rede de atendimento é semelhante ao molde brasileiro anterior a 1988. Com certeza o SUS foi uma das maiores conquistas dos trabalhadores brasileiros. Apesar da universalidade do acesso ao SUS ser direito de todos, infelizmente na prática a teoria é outra. Hospitais superlotados, filas para consultas, para cirurgias, para exames, desespero, dor e sofrimento. Para quem trabalha no sistema, faltam materiais básicos, equipamentos, condições laborais dignas, estrutura física e principalmente falta gente. Uma das principais reivindicações do paciente (hoje chamado de cliente) é que seja pelo menos atendido e dos trabalhadores da saúde é gente para trabalhar. É notório o achincalhamento do SUS por seus gestores. Os investimentos em infra-estrutura, aquisição de equipamentos, de suprimentos básicos, a contratação e treinamento de trabalhadores tem ficado em segundo nos planos dos gestores públicos. Mas porque não são feitos os investimentos necessários? Alega-se falta de dinheiro. Mas porque não se contrata mão de obra, paga-se dignamente, desenvolve-se esses trabalhadores em planos de carreiras sólidos? A Lei 101/00 lei de responsabilidade fiscal arrocha esse desenvolvimento, e dessa forma os gestores se escondem atrás de um redemoinho de problemas criados para que realmente acontecesse o que está acontecendo. Mas no momento em que o SUS vive uma fase de descrédito, passa por uma “crise existencial’ criada por anos e anos de descaso e abandono, eis que surge a solução dos problemas, as messiânicas ORGANIZAÇÕES SOCIAIS DE SAÚDE ou OSS. Repentinamente SUS se torna a galinha dos ovos de ouro. Levando em conta que a legislação que o governo paulista utiliza para legalizar as OSS, é tida como referência para outros estados e até mesmo municípios me basearei nesta legislação em específico. A definição legal para OSS é pessoa jurídica de direito privado com atividades destinadas a saúde. Essas empresas são qualificadas pelo estado não necessitando celebrar licitações para efetivar essas contratações. Fica a juízo do secretário de saúde indicar a empresa que vai gerir o equipamento público em questão. Deixando claro que pode ser qualquer aparelho de saúde, hospitais, laboratórios, ambulatórios e por aí vai uma infinita extensão de oportunidades de usurpação do dinheiro público. Mas os defensores das políticas neoliberais têm argumentos que tentam justificar a implantação das OSS. Por exemplo só pode ser candidata a OSS empresas sem fins lucrativos. Veremos. Vamos pegar, por exemplo, que um estado X terminou de construir um hospital, vai inaugurá-lo e vai entregá-lo para uma OSS Y administrar. Uma das características destes hospitais é que eles atendem nichos específicos, como por exemplo, este hospital pode ser só de transplantes, ou só ortopédico/trauma, infantil. Dificilmente são hospitais gerais, ou com um número maior de referências. Vamos supor que este hospital tenha como referência somente atender pacientes com câncer. Na hora de estabelecer o contrato a secretaria determina que o hospital deva ter que internar pelo menos 400 pacientes mês. Em seu ambulatório terá que realizar 1200 consultas especializadas mês. Terá também que realizar 2000 sessões de quimioterapia mês. Fica acordado também que assim que assumir a OSS terá que adquirir um equipamento que realize radioterapia (Sem licitação). Se a OSS não cumprir todas as consultas, internações e sessões de quimioterapia a OSS terá repassado aos seus cofres pelo estado um valor x. Sendo esse valor x o mínimo que a OSS receberá, não importando a quantidade de atendimentos. Mas se ela for uma OSS bem comportada e cumprir com todas as exigências mínimas, ela receberá x mais 10%. Agora se ela for uma OSS muito dedicada, e atender toda a demanda mínima e mais um paciente que seja, adivinhem o que acontece? A multiplicação dos pães e dos peixes. A OSS em questão perceberá o valor x mais até 70% do valor inicial de bônus. Mas não para por aí. A OSS que administra o hospital também receberá dinheiro do SUS pelos procedimentos, consultas e internações que realizar, de acordo com a sua referência que é oncologia. O SUS por sua vez paga razoavelmente bem, ainda mais quando forem procedimentos de alta complexidade. Mas continuando, essa empresa é obrigada a receber em seu hospital um mínimo de 75% de pacientes pelo SUS, o resto podem ser pacientes de planos de saúde. Esses 25% de pacientes que dão entrada no hospital pelos planos de saúde, ou seja, outras empresas privadas são atendidos normalmente junto com os outros pacientes. Segundo a agência nacional de saúde suplementar, empresa que regula os planos de saúde, existem tabelas mínimas que as operadoras dos planos são obrigadas a pagar à clínicas, laboratórios e hospitais. Essa tabela existe para que os planos não abusem de seu poder econômico, e paguem aquém da tabela aos prestadores de serviço. Mas fica a critério de cada um se fazer valer na lei. Então vejam só como o capital tira coelho da cartola. O que acontece, é que quando alguém se utiliza do plano nesse hospital administrado pela OSS Y, ela vai cobrar um valor menor que a tabela exigia da operadora, beneficiando diretamente bancos e cooperativas que são as maiores administradoras de planos de saúde no Brasil. Lógico que o hospital vai ter prejuízo, mas fique tranqüilo, pois aqueles procedimentos de alta complexidade que o SUS paga e bem, vão cobrir os rombos criados pelos planos privados de saúde. Mas não para por aí, as inatacáveis OSS têm total liberdade para contratar empresas terceirizadas sem licitação, empresas essas que serão pagas com dinheiro público. Terceirizações e contratações de funcionários sem concurso público, que trabalharão na maior jornada possível, com o menor salário possível. Sempre com um objetivo, atender muito e atender rápido. Expediente nocivo esse, quando se troca a conduta médica mais adequada, pela mais rápida, quando se precariza as condições de trabalho, com extensas jornadas de trabalho, com o mínimo possível de salário, sem carreira e sem estabilidade. Eles agem assim e tem como argumento que dessa forma acabam com entraves burocráticos e possuem ferramentas ágeis para o gerenciamento do quadro de funcionários. Mas tem uma coisa que não é dita, por exemplo, quando este hospital atingir sua capacidade máxima, ele simplesmente fechará as portas, atitude que não é tomada por um hospital totalmente público. Claro não estou aqui defendendo que ninguém fique em macas nos corredores, mas fechar o hospital quando se chega ao limite de sua demanda para que se tenha uma impressão de que toda a demanda é atendida e com conforto é hipocrisia. Eles mantêm o hospital limpo, com um ambiente agradável, e fazendo muito dinheiro, com o nosso dinheiro. Isso que são empresas sem fins lucrativos. É óbvio que quem consegue ser atendido vai gostar, mas em detrimento de quem ficou na porta do hospital, ou nos corredores dos hospitais públicos que nunca fecham as suas portas. E o mimo que é prestado aos planos privados de saúde que pagam abaixo da tabela para nossos hospitais, eu queria saber quem cobra esses favores de volta. Argumentam que o problema é de gestão e não falta de recursos financeiros. Sim falta gestão, mas também dinheiro. Primeiro vamos arrumar dinheiro. Em 2008 oficialmente o governo gastou 4,81% em saúde. Isso inclui TODOS os gastos do governo federal em saúde pública. Já para rolamento da divida externa foram dedicados 30,57% de tudo o que o país arrecadou a banqueiros. O que o governo federal gastou com divida pra pagar banqueiro, dava para aumentar o orçamento da saúde em 7,5 vezes. Pode até parecer simplista, mas é a realidade. Isso não é uma exclusividade do governo federal, pois os estados também fazem economia do seu (nosso) dinheiro, os chamados superávits, para pagamento de dívidas absurdas e que não condizem com a realidade social brasileira. Primeiro o governo paga a sua dívida social com o seu povo, e depois se sobrar dinheiro volta a pagar a dívida pra banqueiros. Agora a gestão dos hospitais. Este modelo de gestão neoliberal está errado. Este modelo que entrega de bandeja o bem público conquistado com o trabalho de cada contribuinte, é no mínimo um afronte com toda a população. E acredito ter sido claro, nas explicações. O modelo aqui apresentado é o modelo paulista, mas muito parecido do modelo que se tenta implantar em Santa Catarina, Minas Gerias entre outros estados e cidades. Mas o modelo tradicional, o modelo vigente em grande parte dos hospitais também não funciona. Quando os cargos que preenchem os corredores de um hospital não são técnicos e sim cargos políticos, quando a grande maioria dos caciques está entrando em hospital público pela primeira vez, o que se esperar deles? Lógico nada. Hospitais têm que ser 100% públicos, com servidores concursados, treinados, estimulados em todas as áreas, inclusive vigilância e limpeza. A gestão destes hospitais tem que ser verdadeiramente democrática, com comissões de trabalhadores eleitas pelos próprios trabalhadores junto da comunidade, e com mandato revogável a qualquer momento. Com certeza a luta que nos espera é gigantesca, mas não podemos permitir que a saúde pública, se torne o negócio saúde, que o SUS uma conquista de toda classe trabalhadora se torne alvo da rapina desses urubus, que não medem esforços de aumentar seus lucros, e o tamanho do seu poder. Enfim, vivemos uma crise, não só da saúde, mas também da educação, da cultura, dos esportes, da segurança, vivemos uma crise do sistema em si que cada vez mais se encontra colapsado. Um sistema que cada vez mais exige de nós e cada vez menos devolve, que nos vê apenas como meros robôs programados para consumir. Está na hora de um basta. Trabalhadores vamos nos organizar e lutar rumo a um governo que realmente seja da maioria. Um governo socialista dos trabalhadores.

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